domingo, 17 de junho de 2012

Branco

Eu sabia que hoje tinha que escrever.
Durante a tarde, na hora de Domingo em que todos não fazem nada, abri a janela e deixei o sol entrar, fazendo brilhar a folha de papel branca e lisa sobre a minha secretária.
Olhei em redor... Música?
Chopin começou a tocar.
Sentei-me à secretária e escolhi uma caneta. A de tinta azul para um dia alegre. Uma caneta, o que escrever vai sair directo e à primeira. Hoje tenho os pensamentos claros e as ideias límpidas.
Encho um copo de água. Vidro sem cor, trespassado pela luz do Sol... Água clara e límpida.
Suspiro e olho a folha. O branco pulsa e enche-me os olhos, preenche-me a alma.
A folha cresce, estica-se alarga-se. Branca, cada vez mais branca.
Afundo-me nela enquanto ela me envolve.
Uma excitação miudinha que nasce algures no fundo do estômago desamarra-me o coração. O sangue corre  sem obstáculos fluído e rápido. Um formigueiro na ponta nos dedos, uma vontade nas pernas. Já não sou eu, sou um corpo livre, aos rodopios num campo branco e com todas as cores, sem formas e com todas as paisagens.
Olho para cima e é o céu que vejo de noite e de dia. E não há céu, é uma parede limpa à espera de ser preenchida.
Por mim passam todas as palavras e todas as metáforas... Um turbilhão de metáforas! De mágicas metáforas. E eu leio-as, mas estou de olhos fechados. E sei-as, mas estou a ver o sol... O nascer do sol, o sol no zénite. Estou deitada sobre a relva e sobre a areia e sobre um chão de alcatifa branca à espera de ser tingida.
Adormeço e sinto gotas de uma chuva tímida e fresca... Aguaceiros fortes!
Acordo com um sorriso nos lábios e um brilho nos olhos.
Vou buscar um pano, entornei o copo de água sobre a folha branca.
Hoje já não escrevo.